Como acontece com qualquer pessoa, a vida de Amadeu Pereira forma uma malha entrecruzada de contextos individuais e coletivos. Como tanta da juventude das aldeias da serra do Montemuro (município de Castro Daire), gente nascida num mundo de essencialidade rural quase medieval, Amadeu Pereira rumou para a zona oriental de Lisboa em busca de algo mais e a ida para a tropa acabou por ser decisiva para a profissão que lhe calhou em sorte, a de barbeiro. Quase que por definição, um barbeiro é alguém que escuta, observa e sente o fluxo quotidiano da sua freguesia e Amadeu assume essa condição de cronista informal falando de tudo um pouco: das empresas que empregavam milhares de trabalhadores (as fábricas do “material de guerra”, dos “sabões”, da UTIC – União de Transportadores para Importação e Comércio, da estiva no Porto de Lisboa, etc.), do “pessoal” que era quase todo da “terra” (ou seja das aldeias entre a serra do Montemuro e a serra de São Macário), dos bailes mandados com as contradanças, dos encontros amorosos e, por último, da recente transformação acelerada com viadutos e vias rápidas a cortarem o bairro a meio o que, juntamente com a ida de muita gente para novas casas situadas noutros bairros, tornou aquela barbearia noutra coisa, mais pacata, mas também mais multicultural.

Entrevista a Amadeu Monteiro Pereira realizada por Susana Rocha no dia 24 de fevereiro de 2015 em Marvila (Lisboa). Edição audiovisual de Nely Ferreira.

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